segunda-feira, abril 08, 2013

Uma crise inconstitucional, diz o TC


(imagem: RTP)

Como já havia antevisto, o Tribunal Constitucional pronunciou-se pela inconstitucionalidade de algumas normas previstas no Orçamento do Estado 2013 proposto pelo primeiro-ministro Pedro Passos Coelho e aprovado no final do ano passado pela maioria da Assembleia da República. Nomeadamente, os cortes do subsídio de férias para o funcionalismo público e para os pensionistas,  e contratos de docência e investigação; assim como a criação de taxa sobre o pagamento do subsídio de doença e desemprego. Esta decisão dos 13 juízes do Tribunal Constitucional poderá ter um impacto de 1350 milhões de euros, e obrigará ao Governo a ir à procura de alternativas - e que, mais uma vez, não serão nada bonitas para todos nós.
 
De acordo com o Acordão, a razão do chumbo prende-se com a violação do princípio da  igualdade (para os subsídios) e da proporcionalidade (nas pensões). Este princípio - o da igualdade - está previsto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, e prevê, de forma bastante clara, que "todos os cidadãos têm a mesma dignidade social  e são iguais perante a lei" e ainda que "Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de  qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo,  raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas,  instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual". Assim, pegando nesta disposição dos Juizes do Tribunal Constitucional consideram que o corte no subsídio de férias dos funcionários públicos é inconstitucional porque os prejudica em relação aos trabalhadores no sector privado.

Eu discordo desta interpretação, conforme venho defendendo há algum tempo. Analisando o Acordão do Tribunal Constitucional chego à conclusão de que, de facto, vivemos sob o primado da letra lei e do seu pesado formalismo. Na minha interpretação o princípio da igualdade dispõe tratar igual o que é igual, e tratar diferente o que é diferente. Neste sentido, é indiscutivel que estamos a tratar de realidades diferentes. A realidade laboral dos funcionários públicos e dos funcionários privados é consideravelmente diferente. Ainda não há muito recordo-me perfeitamente da convicção das pessoas em que "entrar" para a função pública era garantir trabalho para a vida. O Estado não fecha. As empresas públicas não fecham - quanto muito mudam de nome. Até à bem pouco tempo o despedimento de um funcionário público era uma miragem. A realidade salarial entre estas classes nada tem a ver, existindo, para os trabalhadores por contra de outrém, um desfazamento bastante grande entre o público e o privado - basta ver as médias salariais para as mesmas funções para ter noção disto.

Ao mesmo tempo esta decisão do Tribunal Constitucional é um defesa do funcionário público. No fundo defendem que se é possível dar regalias, já não é possível retirá-las. E que a subida de impostos é sempre uma realidade que cada governo pode contar, já que, aparentemente, nada tiveram a obstar, mesmo que a carga fiscal atinja laivos de extorsão! Desde que, lá está, seja para todos, como defende o Tribunal Constitucional.

O presidente do Tribunal Constitucional, Joaquim Sousa Ribeiro, defendeu a sua decisão dizendo simplesmente que “A lei do Orçamento é que tem que se conformar à Constituição e não o contrário”. Aqui estamos de acordo. Porém, o que nós estamos a discutir é a interpretação que o Tribunal Constitucional fez da Constituição e da subsunção das normas analisados ao Orçamento a essa mesma Constituição. Ou seja, o que eu discordo é a interpretação dada pelo Tribunal Constitucional daquilo que o texto do Documento Principal da nossa República diz. E, ao contrário do que defende o seu Juiz Presidente, o seu Tribunal não pode estar alheado da realidade do nosso país. Não pode disconsiderar que existe uma situação de excepcionalidade vigente, que o país está submetido a uma espécie de plano de pagamentos com os seus credores, que recorreu a ajuda externa para se financiar, e que necessita, urgentemente, de reequilibrar as suas contas altamente deficitárias, uma situação de défice crónico criada pelos sucessivos Governos que administrarm este país desde 74, com a complacência do próprio Tribunal Constitucional. Qualquer decisão do TC que abordasse as decisões fundamentais da estratégia para o país não pode estar alheada de todas estas condicionantes que o nosso país atravessa. Não pode. Não basta o TC declarar inconstitucional esta crise, para que a mesma seja logo resolvida.


Mas atenção, o facto de eu discordar do Acordão do Tribunal Constitucional, não significa que concorde com as medidas que em si foram analisadas. De facto, considero que ainda existem medidas por tomar para a redução da despesa pública - nomeadamente os desperdícios nas PPP - que este Governo ainda pode perfeitamente deitar mão, antes dos cortes directos nos vencimentos dos seus funcionários. Igualmente é imperativo que o Estado emagreça (e isto significa despedimentos), optimizando os seus serviços necessários. É ainda imperativo que a carga fiscal não aumente - e de preferência que diminua - mas, ao mesmo tempo, que o combate à fraude e à fuga de capitais seja uma realidade.

Mas as pessoas têm também de se convencer que, com direitos existem obrigações, e para que possam receber tudo aquilo a que se habituaram têm de ter um Estado que possa pagar. 


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