terça-feira, julho 12, 2011

A quantas andamos Madeira?

(Foto: Teresa Gonçalves / DN)

Sempre ouvimos como bandeira do Governo Regional da Madeira a vontade da internacionalização da ilha, da sua economia, inteligência, capacidade e produtos. De facto, para uma ilha como a nossa, é um objectivo bastante ambicioso mas, provavelmente, o único caminho economicamente válido face a uma homogeneização do mundo face aos movimentos globalizantes das grandes potências.

Perante o cenário de crise profunda que afecta o nosso país, perante os problemas que são de todos sobejamente conhecidos, tendo a nossa Ilha o seu principal trunfo na promoção turística, quais os resultados práticos das medidas tomadas?

Hoje pode-se ler no DN a seguinte notícia: "Apenas 1% das PME da Madeira exportam". O resultado advém de um estudo promovido pelo INE que analisou os dados referentes ao ano de 2009 e traçou o perfil exportador das empresas portuguesas. É verdade que a Madeira foi apenas exportadora no tempo do ouro branco e que, pela sua natureza, é natural que seja mais importadora que exportadora. No entanto, e como se comprova por este estudo, o peso bruto do confronto entre importação e exportação para as finanças regionais é esmagador. Isto significa, muito simplesmente, que a produção do tecido económico madeirense é quase exclusivamente local.

"Em 2009, havia quase 10 mil pequenas e médias empresas (PME) madeirenses, mas apenas 86 eram exportadoras. Os dados revelados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), mostram, claramente, que o objectivo da internacionalização está muito aquém do desejado, sobretudo para uma economia tão dependente da importação, e também revela que a Região tem, de longe, um dos piores rácios do País nesta matéria". Esta situação é ainda mais preocupante tendo em conta que na Madeira existe uma 'zona franca' composta por mais de 3 mil empresas sobretudo de Serviços Internacionais, que desempenharão o papel predominante face à exportação.

Este problema está igualmente bem expresso na distribuição dos trabalhadores por estas empresas. Dos 52 mil trabalhadores nas PME madeirenses apenas 1.826 estavam ao serviço de PME exportadoras. É de pressupor que a maioria destes trabalhadores está ao serviço das empresas registadas no CINM, o que nos leva a questionar o real efeito prático da existência da zona franca face a este tão baixo rácio, por exemplo pior do que os Açores, cuja 'zona franca' existe no papel, mas não no terreno.

Se a internacionalização empresarial é na realidade bem abaixo do esperado, outras áreas não estão hoje a viver melhores dias. O caso do Rali Vinho Madeira, excluído das provas do IRC por falta de pagamento das quotas já é conhecido e provocará uma quebra enorme num dos principais cartazes turísticos da Região. Para não falar na ausência das transmissões em directo do canal EUROSPORT que levava as belísssimas imagens da Madeira por esse mundo fora.

Mas hoje ainda ficamos a saber que o Madeira Andebol SAD tem o campeonato em risco, já que o clube precisa de 11 mil euros para a inscrição, valor que não tem. Os dias são de aperto financeiro para o vice-campeão nacional, com quatro meses de ordenados em atraso aos atletas, e uma dívida que ascende aos 160 mil euros. Bastou o IDRAM atrasar-se nas subvenções (em falta desde Abril) para cair o caos financeiro sobre o clube. É um claro sinal de que a política de desenvolvimento do desporto profissional tomada pela Região ao longo dos anos, baseada em subvenções e apoios até à pouco tempo sem qualquer controlo ou fiscalização real, começa ora a ceder, fruto da dependência total destas entidades destas verbas estatais e fruto da própria incapacidade de financiamento da própria Região.

Pelo que não espanta, apesar da promoção da Madeira ser uma das razões para a atribuição dos subsídios, do Clube Amigos do Basquetebol (CAB) ter decidido não participar nas competições europeias do próximo ano, apesar das suas equipas terem conquistado o direito para o efeito na época passada. O conjunto masculino conquistou a Taça de Portugal e os femininos sagraram-se vice-campeões na Liga. O critério é puramente financeiros: diz o clube que teria "custos elevados" que "comprometeriam a estabilidade financeira" do emblema.

Tal situação, todavia, acaba por 'trair o espírito' dos contratos de desenvolvimento desportivo celebrados com o GR, tendo por base a legislação da RAM aplicável ao Desporto que aborda a Promoção do Destino Madeira, lendo-se na Resolução n.º 1309/2007 que "uma das vertentes essenciais da política desportiva da Região, assenta na promoção do destino 'Madeira' através da prática desportiva de competição nacional e internacional".

O clube receberá para a época em curso uma subvenção na ordem dos 650 mil euros para ajudar a obter o melhor resultado possível nos diferentes campeonatos, sendo que em caso de qualificação para as competições europeias, a Região custeia ainda as deslocações, alojamento, alimentação e encargos com a arbitragem. Podemos pensar que há, de facto, aqui uma traição do CAB ao acordo assinado - que eventualmente até poderá custar a própria subvenção (ou parte dela). Mas estará o clube a antecipar aquilo que já é uma realidade nas outras modalidades? Atrasos ou mesmo não pagamento do IDRAM? O tempo o dirá.

Também não é segredo nenhum que esta situação é transversal a todas as modalidades na Região. No futebol são conhecidos os problemas do Marítimo e Nacional, expoentes máximos do desporto regional profissional, com a agravante da situação das obras do estádio dos Barreiros.

Apesar de tudo o que foi feito nas últimas três décadas, apesar de todo o bom trabalho, a obra importante, o desenvolvimento criado, a Madeira entrou agora num contra-ciclo económico e social, cuja saída mostra-se cada vez mais complicada do que se esperaria. No fundo tudo se resumo a falta de verbas e, pela primeira vez em muitas anos, o Governo Regional ter de dirigir o rumo do arquipélago com uma dívida acumulada gigantesca, e sem dinheiro.

Pede-se capacidade de gestão por parte do Governo Regional e das suas secretarias. Pede-se contenção, distribuição justa e eficaz das receitas tributárias e maior fiscalização laboral e fiscal. Sobretudo, e porque o dinheiro não abunda, pede-se escolhas acertadas.

No entanto, e apesar de caminhar a passos largos para a falência técnica, continua o GR a insistir em projectos megalómanos ou outros que já provaram que são apenas sorvedouros de dinheiro. Isto sem falar em obras encomendadas e outras eternamente adiadas. Amanhã reabre (se é que alguma vez abriu) a Marina do Lugar de Baixo, ou como já é conhecida a "Marina dos 80 milhões". Apesar da zona de doca para barcos de recreio estar limitada aos poucos 'fingers' que sobreviveram às tempestades marítimas, a restante infra-estrutura foi reconvertida em praia e em campo para futebol de cinco, mantendo-se o ginásio e o bar/restaurante de apoio, para além dos estacionamentos e de um percurso pedonal panorâmico envolvente à marina.

Mas será desta, é a pergunta que se impõe. O histórico de dificuldades da Marina é terrível e, o pós verão irá comprovar se resistirá à força da ondulação marítima e eventuais deslizes no talude. Aos milhões de euros investidos inicialmente, juntaram-se muitos outros milhões para tentar garantir a segurança no local. Com estes avanços e recuos, estima-se que até ao momento a Marina do Lugar de Baixo já tenha 'engolido' cerca de 80 milhões de euros. Entretanto e pese embora todos estes contratempos, o governo mantém a intenção de abrir concurso público para a execução da componente imobiliária do complexo, a lançar numa 3ª fase, devendo incluir a construção de apartamentos de alta qualidade, de uma unidade hoteleira e de uma praia de areia artificial.

A questão é: para quê e para quem?

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