quinta-feira, outubro 04, 2007

Te quiero/Eg elskar deg

Quando Rosa viu Åsmund pela primeira vez, atirou-lhe um "ciao". Ele respondeu-lhe com outro "ciao", à queima-roupa. O encontro, à porta de um "palazzo" italiano que servia de residência a estudantes Erasmus, durou uns escassos segundos, mas serviu para que Rosa percebesse que Åsmund, àquela hora da manhã, era mais do que um norueguês cansado, sem dormir há vários dias. Rosa viu nele a fisionomia "cool" de um “viking”. E Åsmund, estudante de mestrado - e guitarrista da banda norueguesa Nullskatte - percebeu que aquele ciao lhe devolveu alguma energia, depois de uma intensa digressão de duas semanas com a banda.

Recém-chegados a Siena, Åsmund Prytz e Rosa Correa Rodríguez coincidiram naquelas escadas, naquele minuto. Ela estudava Economia na Universidade de Barcelona e resolveu mudar de ares. Ele vinha da Noruega com uma bolsa de mestrado, depois de uma licenciatura em Agricultura que não queria pôr imediatamente em prática. Eram dois dos 276 alunos Erasmus que, no ano lectivo de 1997/1998, escolheram Siena para viver e estudar.

No dia seguinte voltaram a encontrar-se. Sem o saberem na véspera, frequentavam o mesmo curso de italiano. Dessa vez não se contentaram com um olá. No intervalo começaram a falar. Sobretudo de música. Ela era fã de punk-rock e de música de garagem. Isso impressionou-o. Åsmund contou-lhe que tinha conhecido, uns dias antes da partida para Itália, um grupo underground espanhol, os Pleasure Fuckers. No dia seguinte, Rosa chegou ao curso de italiano com uma "t-shirt" da banda, da qual era fã. Ficaram amigos.

Começaram a frequentar os mesmos bares e os mesmos convívios Erasmus. Numa dessas noites, Åsmund pegou na sua guitarra e improvisou os acordes do tema The KKK took my baby away (Ramones). Rosa emprestou a voz. Algumas músicas depois, a espanhola percebeu que o seu namorado de sempre não era, afinal, o "Mr. Right" e Åsmund fez perceber à sua namorada norueguesa que as coisas tinham mudado. Um mês depois do primeiro "ciao" foram viver juntos, à revelia das respectivas famílias e do senhorio de Åsmund. La Coppia Piu Bella Del Mondo (“o par mais bonito do mundo”), de Adriano Celentano, foi a banda sonora daqueles dias. O norueguês e o espanhol ficaram arrumados na gaveta. Era em italiano e inglês que falavam os dias. “Era como nos filmes. ‘I love you, baby’ e essas coisas assim”, lembra Rosa.

Findo o Erasmus em Siena, Rosa e Åsmund separaram-se fisicamente durante algumas semanas. “Quando o nosso ano em Itália terminou, ambos sabíamos que isso não era o fim da nossa história”, diz Rosa. A estudante voltou a casa – a sua família é oriunda da Galiza mas os seus pais vivem em Valência – para anunciar que pretendia ir viver para a Noruega. “De início a minha família não gostou muito. Enquanto católicos, não acolheram bem a ideia de ir viver com o Åsmund sem estar casada com ele. Mas a minha família sempre apoiou as minhas decisões e por isso acabaram por aceitar. Ou então aceitaram porque eu não lhes dei alternativa. Tiveram que lidar com isso”.

Durante algum tempo, viveram os dois em Bangsund. “Foi uma mudança dramática. De Barcelona para Bangsund, uma pequena vila norueguesa com cerca de mil habitantes”. Só mais tarde se mudariam para Oslo, onde Åsmund trabalha actualmente como consultor do departamento de Alimentação do Ministério da Agricultura.

Entre 1998 e 2002, Rosa viveu entre Oslo e Barcelona. Durante esse período, trabalhou num banco, na capital da Catalunha, e, de regresso à Noruega, trabalhou durante um ano como empregada de quarto, num hotel, para aprender norueguês e arranjar um outro tipo de trabalho, mais de acordo com a sua formação. Hoje em dia trabalha para uma multinacional de software, como directora de marketing. A língua não é um problema, porque o idioma de trabalho é o inglês e as pessoas são de diferentes nacionalidades, o que perpetua o “ambiente Erasmus”, explica Rosa.

Rosa e Åsmund vivem juntos em Oslo desde 2002 e casaram-se em Agosto último, em Monforte de Lemos (Galiza). No casamento de Rosa e Åsmund - em Monforte de Lemos, Lugo, Galiza - estiveram presentes pelo menos duas mancheias de amigos de Erasmus. “Eles fazem parte da nossa história”, diz Rosa.

Sempre que estão juntas, as famílias de ambos também vivem um Erasmus próprio, fazendo-se entender como podem. A maior parte das vezes em linguagem gestual. Norte e Sul convivem sem problemas e com muito humor. Rosa acha que os noruegueses são os “espanhóis da Escadinávia”. (in Publico)

Em 2007 cumprem-se 20 anos desde o início do programa Erasmus, que mobiliza anualmente 1,4 milhões de jovens, dispersos por cerca de 30 países.

1 comentário:

il _messaggero disse...

...mais que um programa, erasmus dá uma bagagem e concerteza será para os seus participantes uma verdadeira experiência de vida (em certa medida para nós ilhéus semelhante à experiência de sair da ilha para estudar e viver sem os pais, se bem que num contexto diferente com uma língua diferente)...

...numa altura em que se fala tanto de uma identidade europeia, julgo que era positivo olhar para os benefícios que este programa trouxe, no sentido de criação de uma verdadeira identidade única, numa Europa real algo dividida que ainda dista da Europa unida tantas vezes preconizadas por muitos líderes europeus...