sexta-feira, janeiro 11, 2013

No fim a cobaia morre sempre!




O Fundo Monetário Internacional (FMI) elaborou um relatório, em virtude de uma encomenda do Executivo de Pedro Passos Coelho, para aquilo que foi pomposamente chamado de  a "refundação do Estado português". As suas recomendações, expressas nas vastas 80 páginas do relatório, foram esta semana dadas a conhecer aos Portugueses. E diga-se, a bem da verdade, prometem tempos ainda mais dolorosos.

O FMI no seu relatório considera o Estado Português “um empecilho ao crescimento”, além de ser “grande e ineficiente”, “concede privilégios injustificados”, sendo ainda classificado de “iníquo”, sobretudo para os mais jovens. Aquilo a que chamam de “reformas inteligentes”, que a entidade liderada por Christine Lagarde sugere, entre outras medidas, passa por cortes no subsídio do desemprego, que “continua demasiado longo e elevado”; pela dispensa de 50 mil professores;  pelo aumento do horário de trabalho para 40 horas semanais; pelo aumento da duração das aulas e recurso à mobilidade especial, no âmbito do sistema educativo; pela subida nas taxas moderadoras na saúde e diminuição destes serviços; por cortes nos sistemas de pensões de militares e polícias, considerados “demasiado generosos”; pelo aumento das propinas no Ensino Superior; pelo despedimento de excendentários da Função Pública ao fim de dois anos; pela mudança “urgente” nas tabelas salarias da Função Pública e dispensa de trabalhadores, entre os 10% e os 20%; cortes nos salários e nas pensões e eliminação de todos os regimes de excepção das pensões; pela subida da idade da reforma para os 66 anos e proibição expressa de reformas antes dos 65 anos, mesmo para quem cesse o subsídio de desemprego. Tudo para uma poupar cerca de 4 mil milhões de euros. Em suma, mais apertos para a já apertadíssima carteira portuguesa.

Naturalmente as reacções não se fizeram esperar, dos mais variantes quadrantes da sociedade portuguesa, incluindo de dentro do próprio PSD, e com a oposição do CDS já manifestada.

Mas vamos por partes. Este relatório apresentado é, acima de tudo, um relatório técnico. E tem, naturalmente, esse valor técnico. Ou seja, foi pedido a uma entidade técnica que utilizasse o seu conhecimento e perante a presente situação encontrasse uma forma do Estado Português poupar uns "trocos". E foi isso que fez. Sem qualquer preocupação social, como é evidente. Ou sequer se, perante tais medidas, o país ficaria habitável ou não. Mas isto também não é uma preocupação para o FMI. Essa é, naturalmente, um preocupação política do Estado Português.
  
E, honestamente, é isso que me assusta um pouco. Que essa sensibilidade política e social falhe a este Governo, como já tem acontecido anteriormente. Compreendo que apanharam um país em frangalhos, sem dinheiro e sem capacidade de se financiar. E a partir do momento que aceitamos a ajuda externa, como qualquer devedor, estamos sujeitos às condições do credor que naturalmente não quer perder o seu dinheiro e ainda quer ganhar algum. Mas, por qualquer razão, sinto-me, como muitos Portugueses, que somos uma espécie de cobaia, pronta para testes e mais testes. Às vezes incompreensíveis. Recordo-me que, por exemplo, a 27 de Novembro do ano passado, Vítor Gaspar disse, corroborado pelo presidente do Eurogrupo Jean Claude Juncker, que Portugal e Irlanda seriam beneficiados pelas condições abertas à Grécia. Dias depois, tudo foi desmentido porque não passava de um "mal-entendido", "um erro de comunicação" e que, afinal, o pacote decidido para a Grécia não se aplica a Portugal e à Irlanda. Agora, já ninguém fala nisso. E este relatório indicia que a ideia da "austeridade" como fórmula mágica para a recuperação ainda está na cabeça de muita a gente.

A verdade é que os países da zona euro mais afectados pela crise (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha, Itália), têm sido objecto de estratégias, teorias e políticas fiscais e económicas europeias que, na prática, têm falhado. Corte atrás de corte, a recessão veio para ficar e nem Portugal, nem a Europa em geral, consegue recuperar. E Portugal tem sido, como os outros, a cobaia (quiçá a mais bem comportada) destas práticas. Mas, no fim, a cobaia morre sempre.


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