quinta-feira, janeiro 03, 2008

A Matança do Porco

A par das polémicas habituais sobre touradas, fiscalizações e subida das taxas de juro, o final de 2007 foi marcado por uma polémica (quiçá inesperada), em torno de uma velha tradição madeirense: a matança do porco.

Chamamos "tradição madeirense", mas seja feita justiça, é uma tradição já secular. Advém de tempos idos, de rituais pagãos que se manifestavam através do sacrifício de animais. Primeiro em honra de deuses já esquecidos, evoluindo para a protecção de culturas agrícolas. Actualmente, este ritual ainda presente um pouco por todo o Portugal, já não tem grande significado "ideológico", sendo apenas uma tradição como a decoração de uma árvore de Natal.

Na Madeira a morte do porco ocorre nas vésperas das festas natalícias, usualmente a partir do dia 8 de Dezembro, dia da Imaculada Conceição e o primeiro dia da missa do parto. É um ritual que reúne família, vizinhos e amigos, que vai desde a simples condução do animal do chiqueiro à zona onde ocorrerá a morte, até ao corte da carne.

É um procedimento que começa alguns meses antes, com a criação do suíno num chiqueiro junto à habitação - o que explica que esta tradição seja cada vez mais "rural", devido à grande urbanização da ilha. O porco, por sua vez, é alimentado de restos de comida diária (braje) e de uma mistura de farelo (rolão). Quando chega o dia da matança, em Dezembro, o porco pesará cerca de duas centenas de quilos.

É então amarrado com uma corda pelo pescoço e por uma das patas dianteiras. É colocado no chão, com a cabeça mais baixa que o resto do corpo, a boca amarrada. Os populares seguram na cabeça e nas patas do porco, enquanto o "marchante" (o homem que mata o animal) mete a faca no "vão do porco" (que é a artéria que liga ao coração), deixando o sangue jorrar para um alguidar.

É tradição deitar sal e benzer o sangue com um sinal de cruz, com uma faca, para que ninguem dê " mau olhado". Devidamente temperado com salsa e alho, o sangue é cozido e servido de seguida como "dentinho" acompanhado por vinho seco ou aguardente. Entretanto o porco é desamarrado e coberto por giesta ou urze para chamuscar o pêlo de ambos os lados. É depois arrefecido com panos molhados, raspada a pele com utensílios laminados e lavada a carcaça.

O porco é pendurado de cabeça para baixo para ser aberto ao meio, preso pelas patas traseiras, junto aos tendões. Com recurso a uma faca afiada e com um corte preciso, retiram o intestino e os restantes órgãos, como o coração, os pulmões e o fígado. Parte das carnes cortadas e das miudezas, servem para a refeição do final da tarde. Uma espetada de carne com osso, e carne na panela, são confeccionadas para todos os presentes que acompanham com pão caseiro, semilhas cozidas com casca temperadas com oregãos e inhame, sem faltar o vinho da casa.

Para acabar um dos elementos, o mais experiente no corte, procede à "picada" (o corte e divisão): a febra para a carne de vinho e alhos do Natal. A restante carne será salgada, incluindo a cabeça, as patas, as orelhas, a língua e o rabo. As tripas servem para os enchidos enquanto a banha é derretida para guardar e utilizar nos preparos da cozinha.

Pronto. E é este o procedimento normal e escorreito da "matança do porco". O problema é que nem sempre corre tudo bem. Para começar, a morte do próprio porco. Os velhos anciãos, homens do campo experientes, sabiam exactamente onde e como matar o porco. No entanto, até eles falhavam a artéria. E o que acontece é um cena perfeitamente horrível, onde o porco agudiza até à morte, urrando e ululando. Acreditem em mim, é de deixar todos os cabelos em pé! Eu confesso que não consigo comer depois disso.

E depois, atentemos que este procedimento todo, não é propriamente muito higiénico, ou sequer bonito de se ver! Assistimos "in loco" à "vampirização" e desventramento do porco, ficando ali o bicho pendurado como troféu, às moscas e mosquitos. Nem é, de acordo com os padrões actuais, algo que se goste de mostrar aos filhos ou ver na televisão.

No entanto, foi isso mesmo que aconteceu. Primeiro num programa da RTP Madeira, da Maria Aurora, que acompanhou a matança do porco. Depois, em todas as missas do parto, logo de manhã, as pessoas era presenteadas com uma matança à saída da Igreja. Não me parecem padrões muito cristãos, mas enfim...

Não quero com o atrás exposto, formular juízos de valor ou condenar quem ainda espera um ano inteiro para trucidar um porco à vista de todos e não ser preso. No entanto, e da mesma forma que não vou passar o tempo livre para os matadouros (prefiro o cinema, se não se importam), consigo imaginar coisas melhores que assistir à matança do porco, bem como programas melhores para passar na televisão ou para fazer a seguir a uma missa. A única coisa que condeno é que queiram fazer de uma necessidade humana (comer... e comer carne, o que obriga inevitavelmente que morram animais) um espectáculo hollywoodesco. Para isso já tivemos a Idade Média.

6 comentários:

Anónimo disse...

É um nojo isto...

DAISY disse...

Eu não sou contra a matança do porco, é uma tradição que devemos manter, é para comermos, não é pura diversão como a tourada. Na minha opinião a tradição deve-se manter, quem não consegue ver fecha os olhos

Unknown disse...

Independentemente de outras considerações, nomeadamente as criminais/sanitárias, penso que o que está aqui em questão não é propriamente a tradição em si, mas sim querer fazer dela um espectáculo televisivo / diversão para toda a família. E aqui está o mal... pelo menos para mim.

Rui Caetano disse...

Eu não concordo com este tipo de matança do porco. Acho que é horrível do ponto de vista do sofrimento do animal. É isto que me inquieta apenas. Podem e devem matar, mas não daquela forma que o faz sofrer tanto. Não há necessidade. há tantas formas para o abater. E quanto à tradição, também a pena de morte já foi uma tradição, a inquisição também e tantos outros aspetos da nossa sociedade, mas hoje já não se pratica.

Anónimo disse...

Para comer? Para encher mais o pandulho? Já não basta o comeral excessivo do Natal? Não me admira nada que Portugal seja um pais de obesos e de problemas cardio-vasculares! Já não basta a porcaria que se compra nos supermercados!

Já agora... se devemos manter as tradições, então vamos retomar outra antiga. Deitar os cristãos na arena e deixar os leões come-los. Que tal?

Exibir esta atrocidade, esta vil tradição (metam a tradição num certo sitio) na televisão como um circo é NOJENTO. É HORRÍVEL!

Anónimo disse...

NOSSA ISSO É HORÍVEL MALTRATAREM ASSIM A MASCOTE DO MEU TIME !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! TAMBEM COMO ESSES FDP OUSAM FAZER ISSO COM UM ANIMAL INDEFEZO!!!!