Trata-se de outro caso que tem "apaixonado" a opinião pública portuguesa, muito por razão dos últimos desenvolvimentos.
Há cerca de um mês atrás, foi notícia a morte de cinco jovens na praia do Meco, arrastados para o mar por uma onda mais forte. Um sexto jovem, sobreviveu. Tratava-se de mais uma infelicidade causada pelo mar e eventualmente por incúria dos jovens. Isto até foi relativamente esquecido já que poucos dias depois, um grupo de pescadores perdia a vida no mar da Costa da Caparica. Porém, a medida que novos dados vinham sido tornados públicos, bem como com a maior intervenção dos pais das vítimas, o caso foi ganhando alguns contornos mais curiosos.
Sabemos agora então que os
seis jovens integravam um grupo de estudantes da Universidade Lusófona
que tinham alugado uma casa na zona para passar o fim-de-semana. As
primeiras notícias descreviam que haviam sido “arrastados por uma onda” e
que um conseguira “sair do mar com vida”. Na altura, as autoridades
apenas referiram que o grupo de colegas estaria à beira-mar “na zona de
rebentação quando foi arrastado”. Pouco tempo depois soube-se que
vestiam todos traje académico e que, além de frequentarem a mesma
universidade, tinham em comum a sua ligação à aplicação da praxe
académica na instituição. Cada um deles era o responsável pela praxe no
seu respectivo curso.
O facto de apenas de João Gouveia, o "Dux" (nome dado ao chefe máximo da praxe), ter sobrevivido,
lançou as primeiras dúvidas. A primeira versão dizia que também este
jovem tinha sido arrastado pelas ondas violentas que rebentavam nessa
madrugada mas que tinha conseguido nadar para terra e dado o alarme a
partir do seu telemóvel, o único que teria sido levado para a praia,
aonde os jovens chegaram depois de fazerem cerca de sete quilómetros a
pé. O Diário e Notícias e Correio da Manhã noticiaram que no dia do ocorrido os estudantes foram vistos a "rastejar com pedras atadas aos tornozelos".
Um vizinho, incomodado com o que via, abordou-os e um deles terá
confirmado que estavam a ser praxados, mas também que era “uma
experiência de vida". "Não se meta”, terão dito, denotando que ali
estavam de livre vontade.
Por todas estas razões, levantou-se a questão, que ainda persiste, sobre a causa do alegado arrastamento dos jovens para o mar. Se se estavam demasiado próximos ou dentro do mar e, mais importante, se também isso
faria parte da praxe. O facto de João Gouveia se ter recusado até à data a prestar declarações também tem alimentado a tese da existência de um exercício da praxe na hora do fatídico evento.
O facto do jovem permanecer em silêncio pouco me diz. Era o que eu, em aconselhamento jurídico, faria. Porém, o facto do inquérito se arrastar demonstra que há algo na investigação que está para lá do mero acidente e que, poderá querer indiciar que, naquele momento, poderia estar a acontecer qualquer ritual relacionado com a praxe. Embora seja isto o que a maioria das pessoas imagina, é algo que não me faz muito sentido, visto estes jovens pertencerem à praxe, ou seja, serem eles a praxar e não serem propriamente os praxados. De facto, na minha opinião, esta ideia de que as vítimas
poderiam ter sido coagidas a entrar na água não colhe, dada a idade dos estudantes e o facto de não se conhecer uma
relação forte de subalternização face ao "dux"». De resto,
importa referir que quase todos os jovens afogados já eram licenciados, e
frequentavam mestrados, o que os afasta da classificação de "jovens
caloiros", inexperientes e facilmente seduzíveis. Juridicamente não é um caso sólido.
Seja como for, e apesar de potencialmente apenas ser uma coincidência, este caso teve o condão de, mais uma vez, arrastar o caso das praxes para a discussão pública. Embora também não acredite que daqui saia seja o que for. Creio que este caso irá terminar como começou: como um infeliz acidente.
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